Será que mudou muito?

30/04/2025 12:48

 

(Nos anos 1950)

“A desolação de Manaus, Belém, Fortaleza, Natal, João Pessoa, Teresina, São Luís e Recife. E nem fui ao interior. As capitais bastaram. Nunca imaginei que existisse algo igual na terra. A subnutrição, a miséria, o atraso, a inconsciência quase absoluta do que é bem-estar, o que é uma sociedade civil, o isolamento cultural acima do crível, o atordoamento do ser humano bestializado por um clima (nos dois sentidos do termo) intolerável, inconcebível nos meus confortos de classe média do circuito Zona Sul do Rio, que agora me sugeriam luxos aristocráticos. E, mais chocante, a passividade dócil, amiga, infantil, a festa que nos faziam. Pela primeira vez vi o Brasil, via a nu o crime secular de uma classe dirigente que em crueldade conhece poucos paralelos, que se esconde em falsa afabilidade e em patriotismo, aqui não o último, mas o primeiro e único refúgio dos velhacos.” (Francis, pág. 104).

 

Paulo Francis (1930-1997), jornalista, escritor, crítico de teatro brasileiro em O Afeto que se encerra - Memórias