A vida bate
"Não se trata do poema e sim do homem
e sua vida
- a mentida, a ferida, a consentida
vida já ganha e já perdida e ganha
outra vez.
Não se trata do poema e sim da fome
de vida,
o sôfrego pulsar entre constelações
e embrulhos, entre engulhos.
Alguns viajam, vão
a Nova York, a Santiago
do Chile. Outros fica
mesmo na Rua da Alfândega, detrás
de balcões e de guchês.
Todos te bscam, facho
de vida, escuro e claro,
que é mais que a água na grama
que o banho no mar, que o beijo
na boca, mais
que a paixão na cama.
Todos te busca e só alguns te acham. Alguns
te acham e te perdem.
Outros te acham e não te reconhecem
e há os que se perdem por te achar
ó desatino
ó verdade, ó fome
d vida!
O amor é difícil
mas pode luzir em quaquer ponto da cidade.
E estamos na cidade
sob as nuvens e entra águas azuis.
A cidade. Vista do alto
ela é fabril e imaginária, se entrega inteira
como se estivesse pronta.
Vista do alto,
com seus bairros e ruas e avenidas, a cidade
é o refúgio do homem, pertence a todos e a ninguém."
Trecho do poema A vida bate, de Ferreira Gullar em Poemas Ecolhidos